quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Sakamoto defende a disciplina do mercado livre

Acabo de ler um texto fantástico do Sakamoto. Imperdível. Não é ironia. Sei que ele escreve com o fígado, mas nesse impulso nos apresentou coisas muito interessantes e importantes. Sugiro que leia o Sakamoto e depois volte ao parágrafo seguinte.

http://blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br/2014/10/15/sao-paulo-merece-e-precisa-viver-o-horror-da-falta-de-agua/

Três coisas são dignas de atenção no artigo do Sakamoto. Primeiro, ele reconhece o fracasso do estado e da política em organizar nossas vidas. Realmente, acreditar que há políticos cuidando de tudo e que podemos dormir tranquilos é ser um tanto ingênuo. Sei que ele gostaria mesmo é dizer aos paulistas que falhamos em reconhecer os bons. Talvez. Se na eleição passada tivéssemos votado no Mercadante, poderíamos ter água em abundância para nadar de braçada ainda que não chova. Ou teríamos um escândalo na Sabesp. Quem pode saber? O fato é que costuma não dar certo em parte alguma. Se os bons existem, o povo falha em reconhecê-los.

A seguir, ele adiciona a ideia que deixar as coisas correrem o seu fluxo natural (o que um economista liberal chamaria de "deixar o mercado funcionar") é a solução. Não tenho como não concordar. Agindo livremente nos seus negócios privados, as pessoas cometem erros e alguns podem ser bem graves. Mas, como sofrem diretamente as consequências dos erros, podem aprender. O realismo do mercado livre, no qual as pessoas têm até mesmo o poder de desperdiçar recursos preciosos, pode impor situações muito duras. Sempre que consome algo, há uma conta a ser paga, às vezes na forma de escassez. Mas é reconhecendo a realidade, as limitações, a escassez e as consequências dos próprios erros que os homem aprendem e se civilizam. Não resolve nada desejar ser protegido por um estado-babá. Na hora H, ele falha.  Nem que seja porque nós falhamos em eleger os melhores. Há um tipo de pessoa que não quer aprender nada com isso, pois segue o clamor por mais estado, mais intervenção ou a troca dos gestores, embora haja pouco ou nenhuma evidência de que fariam um papel melhor.

Por último, Sakamoto ainda reconhece que o preço é um importante sinal social. Concordo de novo. Há muito se sabe que, quando um bem ou serviço fica mais escasso ou mais desejado pelas outras pessoas, haverá uma alta de preços, salvo se outras condições do mercado mudarem (como uma tecnologia que reduza os custos de produção, por exemplo). As alterações de preços são simples reflexos das mudanças nas condições de produção de um bem, do poder dos produtores sobre o mercado ou do grau de necessidade ou desejo existente pelo bem na sociedade.  Preços são sinais sociais, produzidos por uma interação complexa onde todos nós influímos, embora de forma desigual e, às vezes, profundamente desigual. Se um preço é alto devido ao monopólio o problema não está no sistema de preços, mas no monopólio. Não devo congelar o preço, mas sim promover a concorrência. Preços são sinais sociais que o estado e os políticos deveriam olhar com bastante respeito e prudência. Sempre é bom pensar dez vezes antes de intervir em algo tão complexo e delicado pois o conjunto das consequências nunca pode ser totalmente antecipado. Acontece o mesmo quando interferimos em sistemas naturais. Nem tudo pode ser previsto.

Afinal, qual a diferença entre o que o artigo diz e o que um economista ultra-liberal diria? A que existe entre o fígado e a teorização racional. Racionalmente, é melhor enfrentar uma crise ambiental e virar uma pessoa melhor depois disto do que ser guiado por governos autoritários que alegam saber o que é bom para nós. Melhor cometermos nossos próprio erros. Se cedermos a liberdade ao estado dominador em troca de uma vida mais confortável, vamos perder o conforto e acabar vivendo como escravos.

Não há economistas no mundo capazes de montar um sistema que funcione melhor que o mercado. Toda forma de planejamento centralizado tentada até hoje falhou. No fundo, Sakamoto acredita muito mais do que os economistas no estado dos nossa ciência, o que é natural. Sou profissional de economia há muitos anos. Sei muito bem o que o planejamento não pode entregar. Um dos problemas da democracia é que o leigo em economia, ou seja, a imensa maioria da humanidade, facilmente pode preferir os economistas e os políticos que afirmem ter soluções superiores às que a democracia e o livre mercado podem gerar. Eles garantem que, se tiverem um pouco mais de poder, podem nos entregar uma vida melhor. É só uma ilusão, mas, quando as pessoas pedem o impossível, só os mentirosos podem satisfazê-las.


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