Quando a Segunda Guerra acabou, em 1945, a Alemanha era um país
destruído. Aliás, nem era um país pois não possuía governo próprio e estava
dividida em quatro áreas de ocupação militar estrangeira. Desses quatro
governos militares emergiram dois países diferentes, um deles uma ditadura
comunista. Menos de setenta anos depois, a Alemanha está reunificada e parece
ser o país desenvolvido mais bem sucedido e adaptado ao desafio chinês. Sua
economia, há muito tempo uma das maiores do mundo, vem conseguindo gerar alto
padrão de vida para a população sem perder sua competitividade.
No mundo globalizado, para ganhar bem e impedir que o seu emprego migre
para a China é preciso ser muito produtivo. A Alemanha consegue isso por alguns
fatores relevantes. O mais óbvio deles é a disponibilidade de recursos: há
trabalhadores capacitados e há empresários com experiência. Menos óbvio é o
papel das instituições e, nesse campo, os alemães parecem estar um passo à
frente.
Após construir uma reputação de país praticante da austeridade fiscal e
monetária, a Alemanha hoje colhe os frutos da sua prudência. Como os aumentos
salariais foram comedidos e a produtividade subiu constantemente, os empregos
industriais vêm se mantendo, mesmo diante dos baixos custos chineses. O mesmo
não se pode dizer de outros países (desenvolvidos ou não) nos quais o consumo
se expandiu acima da produtividade. A mágica é possível por alguma das
seguintes medidas ou por um coquetel delas:
1) expansão do crédito; 2) aumento dos gastos públicos; 3) manutenção do
câmbio valorizado e 4) aumento da oferta de moeda.
As quatro medidas mencionadas têm em comum o fato de aumentar a renda
das pessoas sem que elas precisem tornar-se mais produtivas na mesma medida.
Parece milagroso e o governo que age assim geralmente conquista grande
popularidade. O problema são os resultados no longo prazo. Pois a expansão do
crédito endivida parte da população e expõe os bancos, o aumento dos gastos
públicos aumenta a dívida pública ou os impostos, (o que reduz renda e consumo)
e todas as quatro juntas pioram as contas externas. Pois mais renda significa,
automaticamente, maior importação de bens e serviços.
As democracias parecem ter uma propensão para essas políticas econômicas
arriscadas. Aumentar a renda, mesmo aumentando dívidas e riscos, é sempre
popular. Os eleitores nem sempre compreendem todas as implicações de longo
prazo das medidas. Não fica claro para quase ninguém que um aumento exagerado
das rendas hoje será uma crise externa uns quinze anos depois.
Não conheço tão bem a Alemanha, mas não
consigo evitar de pensar que os países, assim como as pessoas, devem aprender
com os seus erros. Depois de passar por doze anos de ditadura nazista e, uma
parte do país viver os outros quarenta e cinco sob ditatura comunista, creio
que os alemães desenvolveram alguns anticorpos para credos políticos que
prometem o paraíso em suaves prestações. Sabem, por experiência, que é melhor o
estado fazer só a sua parte e que seja não apenas democrático mas também não-gastador
e não-emissor irresponsável de moeda. Talvez a austeridade fiscal e monetária
só seja possível na Alemanha porque não é fácil iludir com promessas mágicas de
riqueza de curto prazo, ainda que garantidas por uma religião social
nacionalista ou socialista.
Adicionalmente, se os políticos nada
ganham proclamando algum evangelho social perante um eleitorado vivido e
realista, o que lhes resta é competir sobre quem tem a melhor filosofia de
gestão. Mas, se os políticos competem assim, devidamente restringidos, toda a
sociedade ganha, pois os cidadão têm melhores serviços públicos e os
empresários contam com ambiente de negócios, infraestrutura e instituições
adequadas. Os próprios políticos honestos ganham porque não precisam lidar com
adversários populistas.
Eu desejo ardentemente que nenhum pais
precise passar pelo que passou a Alemanha para alcançarem tal sabedoria. As crises
dos Estados Unidos e da Grécia poderiam bastar.