quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Problemas com as contas externas do Brasil em 2012


Prezados,


Reproduzo abaixo matéria do Jornal Valor Econômico de hoje (21/12/11). 

O balanço de pagamentos é um dos principais canais de transmissão da crise mundial ao Brasil. As coisas não vão ser fáceis em 2012...

Saldo comercial cairá 88% em 2012 e 


atingirá apenas US$ 3 bi, prevê AEB

Por Daniel Rittner | De Brasília
A balança comercial deverá levar um tombo em 2012 e registrar superávit de US$ 3,040 bilhões. Se esse número for confirmado, será o pior desempenho desde 2001 e significará uma queda de 88,7% na comparação com o provável resultado deste ano, segundo a Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).
Conforme as estimativas da entidade, as exportações serão afetadas pela menor cotação das commodities, chegando a US$ 236,5 bilhões (-7,2%). Já as importações ficarão pressionadas pelos bens de consumo, devido ao aquecimento do mercado interno, e atingirão US$ 233,5 bilhões (alta de 2,4% sobre 2011).
"Esses dados são resultado do cenário internacional em crise, que deve provocar queda nas cotações das commodities, produtos que representam mais de 70% da pauta brasileira de exportações", diz José Augusto de Castro, da AEB. "As importações, cujos produtos manufaturados representam mais de 80% na pauta, poderão ser superficialmente impactadas pela crise externa, pois o governo está adotando medidas fiscais e monetárias para manter o mercado interno aquecido."
As projeções levam em conta uma taxa de câmbio média de R$ 1,80 - variando entre R$ 1,75 e R$ 1,85 -, gerando rentabilidade na exportação de manufaturados para "poucos setores" e falta de competitividade para a "grande maioria", enquanto "não desestimula" as importações. Também considera um crescimento de 3% do PIB e expansão de 15% no volume de crédito interno, além de queda no valor de commodities.
Os preços de produtos como minério de ferro, milho, soja em grãos e farelo de soja devem cair entre 18% e 22%. A queda afetará principalmente mercadorias negociadas em bolsa, consideradas ativos financeiros, que operam com grande alavancagem e volatilidade, segundo avalia a AEB.
O relatório da associação faz uma advertência: "Dependendo da evolução da crise internacional, a hipótese de déficit na balança comercial em 2012, o primeiro após os US$ 731 milhões apurados no ano 2000, não deve ser descartada". Com isso, haverá deterioração da conta de transações correntes, podendo gerar necessidade de captar mais recursos externos ou consumir parte das reservas.
Em 2012, a queda das exportações será puxada pelos produtos básicos (-11,2%), mas também afetará os semimanufaturados (-9,4%, com destaque para alumínio em bruto e cacau em pó) e os manufaturados (-1,5%, com variações maiores para papel e cartão, açúcar refinado e laminados planos).
A alta das importações abrangerá bens de capital (3,6%), bens intermediários (1,7%), bens de consumo não duráveis (7,2%, principalmente produtos farmacêuticos e têxteis) e bens duráveis (11,7%, com destaque para automóveis). Só combustíveis e lubrificantes terão queda das importações (-5,6%), gerando economia de quase US$ 2 bilhões, segundo a AEB.
A estimativa da entidade é sempre aguardada com expectativa pelo mercado, por causa de sua precisão. Em dezembro de 2010, a entidade divulgou projeção de superávit de US$ 26,1 bilhões neste ano. Esse foi exatamente o saldo verificado pelo Ministério do Desenvolvimento até a terceira semana de dezembro.

terça-feira, 15 de novembro de 2011

A Apple tem um modelo de negócios errado no Brasil

A Apple é uma das empresas mais bem sucedidas do mundo. O sucesso é merecido, pois os produtos são inovadores e de alta qualidade. Mas ninguém é perfeito ou está imune a bugs. Apple e Google são hoje os dois principais competidores pelo novos mercados da internet. Os modelos de negócio são totalmente distintos. A Apple aposta em um modelo fechado. Desde sempre ela ofereceu os seus computadores com hardware e software integrados, feitos pelo mesmo fabricante e comercializados conjuntamente. Esta integração permitiu avanços importantes de qualidade. Ao lado, a Google aposta num modelo aberto, que permite gerar produtos com custo menor.

Com o desenvolvimento da computação em nuvem e dos novos gadgets, o modelo fechado da Apple tornou-se ainda mais abrangente. Usando iPods, iPads e iPhones, o consumidor Apple teria tudo integrado usando a nuvem da empresa, o iCloud, e os softwares a ela acoplados como o iMail, o iCalendar, o Iphoto etc. Finalmente, com a existência das lojas iTunes, iBooks e App Store, passava-se a comprar não só hardware e software mas também o próprio conteúdo da Apple, na forma de música, livros eletrônicos etc. É uma integração total de toda a cadeia produtiva, sob o controle da Apple.

Já a Google seguiu um modelo menos integrado. A companhia se concentrou em produzir os softwares deixando para outros a produção de hardware e não controlando de forma monopolista a venda de conteúdos.

Supostamente o modelo Apple poderia gerar qualidade superior, mas há um bug na aplicação do modelo fechado da Apple no Brasil e eu, particularmente, fui uma vítima dele. Como usuário de computadores Apple e apreciador da sua superior qualidade, eu resolvi comprar um iPhone e me tornar um consumidor do mundo fechado da Apple. Não tenho problemas em pagar um pouco mais caro se tiver qualidade de produtos e serviços em troca. Nunca achei mesmo que deveria ter as coisas de graça.

Mas a minha aventura no mundo Apple começou a desmoronar quando precisei de assistência técnica para o iPhone dentro da garantia do produto. Entrei com contato com a Apple que sempre havia me atendido muito bem com relação a todo e qualquer problema. Mas, desta vez, fui informado que a empresa não dá nenhum tipo de suporte ao iPhone no Brasil. Eu deveria procurar a operadora, no caso a TIM, que responderia pela garantia do aparelho.

Não quero contar todas as minhas desventuras aqui, pois seria tedioso. Basta dizer que primeiro fui encaminhado a uma empresa de quinta categoria, que não era autorizada Apple e que demorou três semanas para dizer que não havia problema alguma com o aparelho e devolvê-lo com o visor riscado. Conformei-me. Mas, meses depois, ao saber que a TIM havia cancelado o seu contrato com essa empresa de fundo de quintal e passado a contar com a assistência da Itautec, voltei a entrar em contato com a TIM sobre o meu iPhone com mau funcionamento. Fui orientado a comparecer a uma loja para abrir um pedido de assistência. Disseram-me que a Itautec entraria em contato comigo para dizer como eu deveria proceder. Aguardo há dez dias por uma simples instrução sobre para onde eu devo encaminhar o telefone. Depois serão mais não sei quantos dias para avaliação e assim vai...

Não é possível mais viver sem o celular e os e-mails ao seu dispor. Que fazer? Comprar outro iPhone enquanto espero por uma possível assistência técnica? Mas isso não seria premiar a incompetência? Não seria premiar o desrespeito aos direitos do consumidor? E se eu desse o extremo azar de comprar outro aparelho com problemas? Decidi comprar um celular Android muito mais barato para ir quebrando o galho. Mas, com isso deixei de usar o iCloud e os programas Apple. E também deixei de comprar conteúdo da Apple.

Creio que a Apple deve escolher o que quer fazer no mercado brasileiro. Se quer nos propor o modelo fechado está abrigada a cuidar de toda a cadeia produtiva, inclusive zelar pela qualidade da assistência técnica dos iPhones. Pois, no mundo das nuvens, um produto não se consome isoladamente. Só vou comprar revistas na loja da Apple se puder usar o iPhone e só vou poder fazê-lo se o meu aparelho for consertado ou trocado.

A Apple gosta de sinalizar que seu modelo fechado é quase um compromisso moral com o consumidor. Em várias entrevistas, vimos frases como: "controlamos o conteúdo para que o seu filho não assista pornografia, para que você fique protegido dos virus e do crime informatizado" ou "integramos hardware e software para proporcionar uma melhor experiência". Ok, eu não sou daqueles que fica reclamando de monopólio, mas, se a Apple têm realmente esse compromisso moral, não pode deixar falando sozinho um  usuário com iPhone imprestável e sem uso em plena garantia.

Se o modelo "integrado" permite que, no Brasil, a Apple tire o corpo nessa hora e "terceiriza"o problema, então seria melhor ficar com o modelo Google. Como apreciador dos produtos Apple, eu torço para que ela mude a sua política com relação ao suporte aos iPhones no Brasil. Até lá, conclui que os consumidores fazem melhor optando por produtos Android.

Quanto ao meu problema particular, vou responsabilizar a Apple e não a TIM ou a Itautec. Eu não sei que contratos a Apple tem com a TIM e esta com a Itautec e, pensando bem, isso não é da minha conta. Comprei o iPhone por se tratar de um produto Apple. Fiz apenas duas perguntas ao comprá-lo na loja da TIM: (1) O aparelho é desbloqueado? (2) Vai me obrigar a alguma fidelidade? Só adquiri ao saber que era desbloqueado e sem fidelidade. Na minha cabeça eu estava casando com a Apple e não com a TIM. Ao entrar no site da Apple Brasil somos conclamados a comprar iPhone. Muito bem, se a Apple do Brasil anuncia o produto em nosso mercado, deve responder por ele. Mas ainda vou perguntar para a minha advogada como ela vê esta questão.

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

O que as medalhas do Pan têm em comum com a guerra dos Balcãs?

Estamos sendo assolados por denúncias bastante fundamentadas de que o PC do B teria montado um “esporteduto” para desviar dinheiro público aos montes através de ONG's que, teoricamente, deveriam estar investindo esses recursos no esporte.

A relação entre comunismo, nacionalismo doentio, esporte, captura do Estado e crime é antiga e já foi bastante relatada. Estou lendo, com certo atraso, um livro muito importante sobre o assunto e que recomendo a todos: McMáfia: o crime sem fronteiras de Misda Glenny (Companhia das Letras, 2008). Vejam o que há na página 46 sobre o período das recentes guerras na ex-Iugoslávia:

“Ainda mais chocante, porém, era o fato de que os mesmos homens que alimentavam a guerra entre seus povos estavam, em particular, colaborando entre si, como bons amigos e parceiros de negócios. Os homens do dinheiro e os gângsters croatas, bósnios, albaneses, macedônios e sérvios eram como unha e carne. Compravam, vendiam e trocavam todo tipo de mercadoria, sabendo que os laços de confiança entre eles eram muito mais fortes do que os vínculos transitórios do nacionalismo histérico. Isso eles fomentavam entre a gente comum, essencialmente para mascarar sua própria venalidade. Como descreveu um analista, as novas repúblicas eram governadas ‘por um cartel que emergiu do Partido Comunista no poder, da polícia, dos militares, da máfia, e que tinha o presidente da República no centro da teia de aranha [...] Para o cartel, o nacionalismo tribal era indispensável como instrumento de pacificação de seus subordinados e para disfarçar a contínua apropriação do aparato estatal”.

O resto do capítulo mostra como a guerra gerava a oportunidade de vender armas, petróleo e outros produtos sob embargo a preços elevadíssimos.

Nós fomos atingidos por uma versão branda desse vírus. Nós não estamos e nem vamos entrar em nenhuma guerra real. Mas usando uma tecnologia que deve ter aprendido com os Partidos Comunistas do Leste Europeu e da Ásia, o nosso PC do B está conduzindo vitoriosamente uma guerra simbólica. Nosso resultado de medalhas no Pan-Americano é impressionante. Motivo de alegria e orgulho para as pessoas que gostam de esportes, especialmente os mais velhos que se lembram de fiascos terríveis em competições anteriores, mesmo Pan-americanos. Mas qual esta sendo, e mais importante, qual ainda será o preço disso tudo (mais a Copa e a Olimpíada) em termos de desvio de dinheiro público e de ocupação não-democrática da máquina do Estado?

Felizes os países onde o nacionalismo já não é bem visto. Na Alemanha, onde a exaltação da pátria foi usada até o limite último pelos nazistas, se um político se apresentar como nacionalista, perderá votos importantes.

Seria também muito bom se os impostos que os brasileiro pagam em proporções escandinavas pudessem realmente ser utilizados para o bem público. Teríamos as mesma medalhas, ou na pior das hipóteses algumas a menos, porém melhores escolas e hospitais. Não sei se os suecos ou dinamarqueses realmente se preocupam com o escasso número de medalhas olímpicas e de títulos internacionais de futebol. Mas sei que
Ceaucesco, Enver Roxha, e Fidel Castro, entre outros, levaram isso muito a sério.

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

A crise e os movimentos de massas

O maior dano que a atual crise econômica pode trazer não é econômico em si, mas político. Os movimentos de massas, como aqueles que estão se desenvolvendo, sempre iniciam ciclos de renovação política. Mas, numa grande renovação, está implícito o risco do populismo. 


Recomendo vivamente a leitura do artigo abaixo.

http://www.economist.com/node/21533400

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Reflexões durante o luto por Steve Jobs

Eu fiquei pessoalmente chateado quando soube da morte de Steve Jobs. Como ele era uma pessoa muito reservada com relação à sua vida familiar, sabemos menos sobre sua personalidade do que, em geral, sabemos sobre outras celebridades. Mas, como aficionado em tecnologia e usuário dos seus produtos acabei desenvolvendo carinho e admiração pela sua figura. Talvez sua doença (a mesma que vitimou meu pai) tenha aumentado meus sentimentos por uma pessoa que, afinal, só conheci pela imprensa. Mas, para além da emoção, não podemos deixar de admirá-lo. Tantos já destacaram seu talento como inventor e como empresário, que quase nada há para acrescentar. Mas, quero fazer três considerações que me parecem pertinentes e sobre as quais ainda não li.

A primeira é que Steve Jobs foi alguém que realmente acreditou no mercado como uma instituição meritória, inclusive no seu sentido moral. Uma vez li numa entrevista sua que as pessoas vêm carros maravilhosos em feiras comerciais, mas estes "carros conceito"nunca estão à venda. Sua obsessão pela qualidade dos produtos teve a força de um compromisso moral. Steve realmente acreditou que oferecer o melhor e respeitar moralmente os consumidores era também a melhor forma de se ganhar dinheiro no longo prazo. Como disse Adam Smith, não devemos a carne à boa vontade do açougueiro, mas do seu desejo de lucro. Assim, muitos açougueiros podem pensar em fazer apenas o mínimo ou só o suficiente, uma vez que a finalidade é só o lucro. Steve Jobs desejava que seus produtos fossem quase uma forma de arte. O padrão de qualidade que a Apple criou é realmente fantástico.

Minha segunda reflexão é sobre os Estados Unidos. Impressiona o quanto este este país foi beneficiado, ao longo da história, por seu liberalismo e afluência econômica. O pai biológico de Steve era um imigrante. Os milhões de refugiados políticos, raciais, religiosos e econômicos que esse país recebeu representaram um acréscimo importantíssimo na capacidade de se fazer ciência e arte. A China poderá rapidamente dominar toda a cena industrial, mas os novos produtos ainda são inventados nos Estados Unidos e por muito tempo o cinema e a música de lá dominarão amplamente seus congêneres chineses. A China terá problemas para produzir inovação e arte, pois é uma ditadura. Sem livre circulação de idéias, há menos incentivos para os inovadores e os artistas.

Minha última reflexão é sobre o alcance da revolução iniciada por Steve Jobs. Claro que não foi só ele, pois milhares de homens contribuíram para a arrancada tecnológica. Mas Steve foi o maior de todos e o símbolo, até agora, desta época. Foi ele quem mais contribuiu para realmente popular o computador, que deixou de ser coisa de nerds e passou a ser indispensável também para músicos, fotógrafos, artistas plásticos, estudantes, qualquer pessoa enfim. O potencial desta revolução ainda é pouco entendido, porque ela está apenas começando. Já mudou a nossa maneira de ir ao banco, de falar com parentes distantes, de comprar e ouvir música, pagar impostos e uma lista infindável da qual não podem ficar de fora as próprias revoluções políticas. Vale lembrar o papel que a internet e os objetos que tornam possível acessá-la cumpriram nas revoluções do mundo árabe.

Após haver melhorado tanto a vida das pessoas, poucos homens poderiam chegar ao fim da sua vida merecedores de tanto crédito. Descanse em paz, Steve Jobs.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Para que serve uma economia próspera?


O livro de Joseph Stiglitz, O mundo em queda livre (Cia das Letras) é uma leitura obrigatória para todos os que querem ter uma visão ampla da crise, suas causas remotas e imediatas e suas consequências. Mas o mais interessante de tudo é o fato de que os tempos que vivemos permitem aos economistas expressarem-se como filósofos e especularem sobre quais são os fins últimos e o que devemos considerar como bem supremo.
Vejam o que escreveu o ex-economista chefe do Banco Mundial:
“Dizem que uma experiência de proximidade com a morte força uma pessoa a reavaliar suas prioridades o seus valores. A economia global acaba de passar por esse tipo de experiência...
Avançamos muito por um caminho alternativo - criando uma sociedade em que o materialismo predomina sobre os compromissos morais; em que o crescimento rápido que atingimos não é sustentável, nem do ponto de vista ambiental nem do social; em que não agimos em conjunto, como uma comunidade, para atender às nossas necessidades comuns, de certa forma porque o individualismo desabrido e o fundamentalismo de mercado erodiram qualquer sentido de comunidade e levaram a uma exploração selvagem de indivíduos inocentes e desprotegidos e a uma crescente divisão social. Ocorreu uma erosão da confiança - e não apenas nas nossas instituições financeiras. Ainda há tempo para curar essas feridas.” (livro citado, pags. 388 e 389)